sábado, 17 de novembro de 2018

Lamborghini: o primeiro touro na Fórmula 1 (Parte II)


Vamos à parte 2 do texto sobre a Lamborghini...
Na primeira parte (ver aqui), explicou-se a origem da marca e o início do projeto F1 da fábrica.
Como dito, a nova dona da Lamborghini, a americana Chrysler, tinha planos grandiosos. Além de se colocar como marca global, a intenção era bater de frente com a Ferrari. De certa forma retomar os ideais do velho Ferruccio.  E nada melhor do que bater com o inimigo em seu terreno.
Para isso, a Chrysler deu carta branca para que os italianos fizessem o necessário para a construção de um motor de Fórmula 1. Um bom dinheiro foi disponibilizado e se contratou técnicos de boa reputação, sendo Mauro Forghieri a “cereja do bolo”, sendo responsável por toda a parte técnica.
87 foi o ano de montar a estrutura. Aproveitando os investimentos americanos, uma nova ala foi construída em Sant’Agata Bolognesi para atender ao novo grupo e seu maquinário. Forghieri também trouxe alguns nomes de sua confiança que passaram pela Ferrari para trabalhar neste projeto.
Debruçando sobre o regulamento técnico da nova fase da categoria, com o banimento dos turbos a partir de 1989, a escolha pelos V12 foi natural: primeiro, pela identificação histórica da Lamborghini com esta arquitetura; segundo, por esta configuração ser de domínio de boa parte da equipe técnica, basicamente oriunda da Ferrari e Alfa Romeo.

No início de 88, as linhas gerais foram definidas: um V12, com uma inclinação de 80º entre o banco de cilindros. Tal configuração foi vista com vistas a permitir que o chassi fosse construído mais baixo, diminuindo o arrasto aerodinâmico, sem contar a possibilidade de obter mais potência.
A notícia de que a Lamborghini estava planejando um motor correu como pólvora entre as equipes. Naquele momento, poucas opções estavam disponíveis. Além da Ford com os Cosworth V8, se tinha a certeza da Honda com um V10, a Judd com o V8 e se falava na possibilidade de retorno da Renault (que se confirmou alguns meses depois) e da Alfa (que havia sido comprada pela Fiat e rompeu um acordo de fornecimento com a Ligier no ano anterior, indo para a Indy). A Ferrari já testava o V12 em Fiorano e a Yamaha anunciava um V8 em caráter exclusivo para a Zakspeed.
Audetto e Forghieri eram assediados de todos os lados em San Marino e Mônaco. Quase todo o “circo” veio assuntar. Naturalmente as italianas (Minardi, Scuderia Itália, Osella e Coloni) foram as primeiras. A Ligier também olhou comprido, já que vinha apanhando com o Judd e tinha a esperança que Mitterrand, Presidente francês e “amigão” de Guy Ligier, metesse seu bedelho para que a Renault lhe desse motores...
Os ingleses também se animaram: a Lotus procurava um acordo interessante, já que a Honda avisou que só ficaria com a McLaren e a Renault não queria nem ouvir falar neles. A Tyrrell, apesar de todo seu histórico com os Cosworth, considerava dar um salto à frente.  A Brabham, que tinha sido cortejada pelos italianos para uma possível aquisição, planejava seu retorno sob nova direção e também demonstrou seu interesse.
Mas a coisa mudou quando colocaram as condições de fornecimento. Os italianos procuravam uma equipe de porte médio ou grande para fornecer. O serviço previa um total de 30 motores por ano, incluindo revisões e melhorias. Além do mais, não se previa uma participação a fundo perdido. Quem quisesse os motores Lamborghini teriam que desembolsar a bagatela de US$ 2 milhões/ano.
Tal pedida afastou muita gente. Afinal, os Ford e os Judd custavam metade do valor e, de certa forma, eram de conhecimento do meio. No meio da confusão, sobraram na negociação Lotus, Larrousse, Ligier e March.
A Lotus se via apertada, já que boa parte do orçamento era para pagar o salário de Nelson Piquet e a equipe estava tecnicamente desfasada, além de ter feito um péssimo chassi, o 100T. A R.J. Reynolds (controladora da Camel) não liberou fundos extras e não houve acordo. A Ligier, que sofria com a Judd, esticou a decisão até onde pode, já que contava com a Renault e com um reforço de caixa das estatais francesas. Não contou com uma coisa e nem outra.
A March vinha sendo assediada pelo seu patrocinador, a gigante japonesa imobiliária Leyton House, para assumir o controle. Vendo o sucesso da Honda e diante da enxurrada de ienes, Akagi San tinha planos grandiosos para expandir a operação. E isso incluía um motor novo. Além da possibilidade italiana, havia a possibilidade de continuar com os Judd, que vinha trabalhando em um novo motor atendendo à algumas sugestões de Adrian Newey. No fim, ficaram com esta opção.
E restou a Larrousse/Calmels, que não vinha sendo citada até agora. A pequena equipe francesa, comandada pelo ex-piloto e chefe de equipe da Renault e Ligier, Gerard Larrousse, e pelo empresário Didier Calmels, vinha em uma progressão interessante. Inicialmente concebida como um time de F3000, os franceses fizeram uma parceria com a Lola Cars, que quem fabricava os carros, e foram direto para a Fórmula 1, usando os motores Ford Cosworth em 87 e alinhando um único carro.  
A intenção era disputar o campeonato dos aspirados, que era disputado em paralelo ao mundial. Mas os resultados foram melhores do que os esperados:  vice-campeonato entre os aspirados e terceiro posto para Phillipe Alliot. Além disso, o francês ficou em nono lugar geral entre os construtores. Mostrando olhos no futuro, a equipe alinhou um segundo carro no GP da Austrália com Yannick Dalmas e negociava com o Governo da Alta Normandia um terreno para uma nova fábrica.
Em 88, a equipe alinhava com dois carros desde o início do ano, ainda com Alliot e Dalmas. Era uma operação simples, mas bem estruturada. E chamou a atenção dos italianos.
As negociações correram relativamente rápido e no fim de semana do GP dos Estados Unidos, Didier Camels e Gerard Larrousse adentravam à sede da Chrysler em Detroit, onde assinariam contrato de fornecimento exclusivo para a temporada de 1989, sob as bênçãos de Emile Novaro, Presidente da Lamborghini, e Robert Lutz, Presidente da Chrysler.
Sabendo agora quem seria o cliente, o trabalho correria mais aceleradamente em Sant’Agata Bolognese. A equipe definia os últimos detalhes de configuração para iniciar a fabricação, com base também as informações dos diversos técnicos contratados. E o primeiro exemplar ficou pronto em setembro de 1988. Em paralelo, a Larrousse vinha com um gabinete técnico bem revisado, contando com Michel Tetu, ex-Renault e Ligier, e Gerard Ducarrouge, que havia sido defenestrado da Lotus.

A terceira parte em breve: a primeira temporada completa e a tentação do carro próprio batia à porta...

terça-feira, 6 de novembro de 2018

Lamborghini: o primeiro touro na Formula 1 (parte I)


Antes da Red Bull, um outro touro “nervoso” já esteve na Fórmula 1. A Lamborghini, icônica fábrica italiana de esportivos, esteve na categoria entre 89 e 93.  Embora não tenha tido grandes resultados e deixado o gosto do “o que poderia ter sido”, deixou boas lembranças no fã de velocidade. Por este motivo, começo esta sequência falando sobre a marca de Modena.
Confesso que esta série foi motivada pelo espírito do “se não gostou, vá lá e faça!”. Um outro site fez um resumão sobre a participação dos italianos na Fórmula 1 e, na minha opinião, ficou muito aquém da qualidade habitual. Então, lá vamos nós...
Introdução
A Lamborghini já existia como uma fabricante de...tratores. Utilizando motores da 2ª Guerra, Ferruccio Lamborghini, que já era bastante rico, montou uma fábrica de tratores e obteve bastante sucesso. Além de empresário, era um apaixonado por carros velozes.
Ferruccio Lamborghini e suas máquinas...

Reza a lenda que a fábrica de automóveis nasceu da insatisfação de Ferruccio com a Ferrari. Tendo comprado uma 250GT, o achou mal-acabado e encontrou problemas com a embreagem de seu carro. Após diversas idas ao serviço de assistência e aproveitando a estrutura de sua fábrica, montada em Sant’Agata Bolognese (25 km de Modena), e, Ferruccio descobriu que a peça era a mesma que usava em seus tratores...
A história diz que Lamborghini foi reclamar com o Commendatore Enzo Ferrari sobre o carro, o aconselhando a usar peças de melhor qualidade. Sem pestanejar, o velho Ferrari o mandou às favas, dizendo para que ficasse com os seus tratores...
Se aconteceu isso mesmo, a dúvida fica até hoje. O certo é que Lamborghini começou a projetar seus carros em 1962 e em maio do ano seguinte, fundou a “Automobili Ferruccio Lamborghini”. Em novembro, contando com ex-técnicos da Ferrari e jovens como um tal de Gianpaolo Dallara, é apresentado o GTV350.
Em 1964, o primeiro grande sucesso, o 400GT. A seguir, vieram os carros com nomes de touros (Ferruccio adorava touradas): Miura e Urraco. Não podemos também esquecer o Islero, Jarama e o Espada.
Em 1972, graças a diversos negócios desfeitos e pressões sindicais, o grupo Lamborghini enfrentava problemas financeiros. Ferruccio vende a fábrica de tratores para o grupo SAME e 51% da fábrica de automóveis para o financista suíço Georges-Henri Rossetti. Em 74, o velho italiano vende o restante de suas ações para René Leimer e se retirou para uma mansão em Perugia, onde ficou até falecer, aos 76 anos, em 1993.
Com a primeira crise do Petróleo em 73, o mercado de supercarros foi afetado e a Lamborghini foi atingida com força. Enquanto a Ferrari se acertou com a Fiat, a marca foi definhando e faliu em 78, com a justiça italiana assumindo o controle. Em 80, os irmãos Jean Claude e Patrick Mimran compraram a Lamborghini, a controlando até 86...
O início de tudo
Neste momento, a Lamborghini havia se recuperado empresarialmente e vinha tocando sua vida numa boa. Mas Patrick Mimran, então CEO da empresa, resolveu a colocar à venda. Vários interessados apareceram e em 24 de abril de 1987, a americana Chrysler anunciou a aquisição por 25 milhões de dólares.
Foi uma surpresa esta compra. Os americanos estavam na crista da onda, embora ainda estivessem atrás da Ford e GM, após terem saído de uma situação difícil no final da década de 70/início da década de 80. Seu CEO, Lee Iacocca, era tido como um midas e tinha planos grandiosos para tornar a Chrysler uma empresa global. A compra da Lamborghini estava englobada nestas ideias.
E uma das frentes abertas pelos novos donos foi entrar nas competições, batendo de frente com sua concorrente de sempre, a Ferrari.
Este foi um dos pontos mais surpreendentes, já que uma das bandeiras do velho Ferruccio era ficar de longe das competições (“Desejo fazer carros GT sem defeitos. Bem normais, convencionais e perfeitos. Não uma bomba técnica”). Este foi um dos motivos fizeram Gianpaolo Dallara sair da empresa no final dos anos 60. Alguns esforços foram feitos por equipes independentes, mas sem apoio oficial. O máximo que se teve foi o desenvolvimento de um LM002 para o Paris-Dakar de 86, mas que participou de outros eventos menores (o carro só foi fazer o Dakar em 96).
A intenção era seguir os passos da fábrica de Maranello (Lamborghini e Ferrari são quase “vizinhas”. As fábricas distam 40km uma da outra). Construir carro e motor para participar da Fórmula 1. Para tal, foi criada a Lamborghini Engineering, comandada por Emile Novaro e com coordenação de Danielle Audetto (ex-Ferrari), Mario Tolentino e Luigi Marmiliori (ex-Alfa Romeo) na parte técnica.
Um dos projetos iniciais foi...comprar a Brabham. A esta altura, Bernie Ecclestone já havia dado mostras que gostaria de se dedicar a outras atividades. Algumas conversas foram iniciadas, mas o valor assustou (se falava em 25 milhões de dólares, mesmo valor gasto para a compra da Lamborghini). O foco passou a ser a construção do motor, que seria feito para atender os novos regulamentos da Fórmula 1 a partir de 1989.
O maior golpe foi dado em maio de 1987. Insatisfeito com os rumos que a Ferrari tomava e com cada vez menos espaço na estrutura, o histórico engenheiro Mauro Forghieri pedia demissão e se juntava à Lamborghini como responsável pelo projeto do motor. A transferência foi tão impactante que mereceu capa da prestigiada Auto Sprint (foto abaixo).


Com a chegada de Forghieri, o projeto tomou impulso e não foi difícil fechar as linhas mestras do motor. Basicamente seria um V12 (marca da Lamborghini), com uma inclinação de 80º entre os cilindros. A estimativa era que gerasse inicialmente cerca de 650cv.
Os trabalhos começaram em 87 e as primeiras versões ficaram prontas em 88. A tentação da equipe própria voltou a assombrar, sob a desculpa de que precisariam de um chassi para desenvolver o motor. E uma fila de equipes começaram a fazer peregrinação à Sant’Agata Bolognese para saber mais sobre a nova usina italiana....
Próximo passo: as negociações para a Fórmula 1.


quinta-feira, 1 de novembro de 2018

A (des)informaçao no automobilismo


O foco aqui é automobilismo. Mas pode se aplicar a uma série de outras coisas e áreas. É um desabafo e desde já peço desculpas.
Quase um ano atrás, escrevi sobre a via crucis do amante brasileiro de automobilismo em se informar. Falei exatamente da existência de poucos veículos de qualidade em português para que se tenha dados de forma confiável. Em suma: fazer um jornalismo de qualidade.
Ainda neste texto, falei que neste sentido, vários sites feitos pelos abnegados, fora dos “grandes veículos”, fazem um trabalho sincero e ótimo neste sentido. Categorias como a NASCAR, WEC, F-E e a Indy tem locais de informação que não deixam nada a dever. Mesmo com traduções, não se perdem e mantém o verdadeiro sentido da matéria. Claro que também nos “principais” tem gente de qualidade que vale a pena ser lida, vista e ouvida.
O que me espanta neste sentido são os “falsos profetas”. Sempre prezei pela qualidade e me lembro de algo dito recentemente pelo amigo Ialdo Belo (que milita há vários anos no campo): busque sempre o máximo de informação. Esteja certo do que você vai escrever pois vão te questionar. Se tiver algo errado, por mínimo que seja, vão te jogar pedra. (Em tempo: se você estiver lendo isso Ialdo, saiba que a lição está tentando ser aplicada. O respeito e o carinho continuam).
Da mesma forma que temos sites “sérios” que lançam notícias a esmo e colecionam um festival de “barrigas” (termo jornalístico para as notícias que não se concretizam), existem vários “amadores” que se arvoram como “analistas”, copiam daqui e dali e jogam tudo no Google Translator (como vários veículos “sérios”), gerando verdadeiros “Franksteins”.
Por um lado, acho bacana a questão de querer disponibilizar a informação para quem quer ler em português e acha que não tem condição de acessar os sites “gringos”. Mas o preocupante é a falta de cuidado.
Não digo que sou melhor do que ninguém ou me arvorar a ditar regras. Erro e muito. Mas quando você vê pessoas que se consideram “referência” misturar segundos com décimos, quilowatts com cavalos, copiar literalmente coisas dos outros sem o devido crédito ou escrever coisas sem sentido, dá tristeza. O pior é muita gente entrar nesta “canoa furada” e achar que está se informando bem. E transmite para outro e aí o estrago já foi feito.
Isso que entristece. É a forma sendo colocada acima do conteúdo.
Talvez o errado seja eu. Talvez o certo seja mesmo seguir estes “especialistas”, fazer de qualquer jeito e preocupar em fazer um fazer um esquema legal de SEO para ficar bem nos buscadores e aumentar a audiência de qualquer jeito. Aí dá pra monetizar numa boa.
Mas da mesma forma, sei que os fãs de automobilismo são criteriosos (eu incluso) e tratarão de fazer a seleção natural, tanto dos medalhões como dos “amadores” (estou neste grupo). O pedido que fica para todos é: Q U A L I D A D E. Não parem, prossigam. Mas sempre se preocupando com o que é passado ao outro. Hoje, é muito fácil publicar alguma coisa e correr mais rápido do que rastilho de pólvora.

OBS: Estes que coloquei as fotos sao alguns daqueles que reputo como referências historicas e atuais.