A série "Carros que amamos" retorna ao F1Raiz e traz desta vez o imponente Shadow DN5. André Luiz Bonomini volta ao espaço para falar sobre este impactante carro.
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LICENÇA POÉTICA:
Shadow DN5 entre altos e baixos
Nas minhas primeiras pesquisas sobre a F1
dos anos 1970, e isso já vai pra mais de anos, me restringia por vezes as
matérias publicadas pela Quatro Rodas sobre os melhores lances das corridas. Se
a memória não me falhar, eram dois GPs por edição, isto quando a revista
inchava e vinha, em anexo, um suplemento com ainda mais fotos dos GPs em
destaque.
E sabe como é, uma pesquisa sempre é um
mundo novo a ser descoberto. No caso da F1, era uma explosão de novos nomes,
carros e pistas. Quem vai pensar eu, na minha inocência jovem daqueles tempos,
que já teve corrida na Suécia ou numa pista mítica como Watkins Glen ou até
mesmo nas elegantes curvas de Montjuich Park, a "Monaco do
mediterrâneo", em Barcelona. Um deslumbre atrás do outro.
E entre tudo isso, claro que algumas coisas
sempre chamam a atenção, entre o básico icônico - como os Brabham BT44 e as
Ferrari 312T. Mas, nos grids setentistas, uma presença começava a me instigar a
curiosidade. Uma equipe britânica com sangue americano, elegantemente trajada
em preto e tendo ao volante um francês de pé pesado e um promissor galês: eis a
Shadow.
Eu sei que o nariz-de-cera intimista que
fiz já deu três parágrafos, mas vamos aos pequenos - e necessários - detalhes
até chegar ao nosso bólido da vez: A Shadow tem uma história puramente
setentista, daquelas equipes que nasceram, cresceram e morreram em uma década
apenas e que, por isso, ao menciona-la sempre vem a clara mente a recordação
dos anos 1970, do invencionismo e do romance ainda na moda.
Fundada em Northampton por Don Nichols (daí
o DN do nome dos carros), o time correu na F1 entre 1973 e 1980, sendo nos três
primeiros anos com licença americana por conta do seu fundador. Entrou no circo
em 1973 ao mesmo tempo que escrevia a história no torneiro Can-Am americano,
com protótipos elegantemente trajados de preto e ostentando a marca da UOP
(Universal Oil Products), uma das mais conhecidas refinarias de derivados do
petróleo do mundo.
Sua cor negra parou na F1 naquele 1973
tendo ao volante do DN1 o americano George Follmer, campeão de Can-Am no ano
anterior, e o futuro desertor do time, Jacke Oliver. Ainda teve Brian Redman
como um de seus pilotos durante o ano e Graham Hill (abaixo) como um de seus clientes, adquirindo
um chassi DN1 para o começo de sua aventura como chefe do próprio nariz no
mesmo ano.
Em 1974, o projeto do DN3 mostrou uma boa
evolução e a dupla de pilotos, contando com o pé-de-chumbo Jean-Pierre Jarier e
o americano Peter Revson, prometia muito para o ano. O francês iria se
concentrar apeans na F1 enquanto Peter, herdeiro da famosa marca de cosméticos
Revlon, deixava a Mclaren para buscar novos ares no time negro de Nichols.
No entanto, o baque da morte de Revson nos
treinos para o GP da África do Sul daquele ano desestabilizou a equipe. Jarier
foi guindado a posição de líder do time na pista, enquanto o segundo carro
passou, algumas provas depois, para as mãos de um jovem galês com talento para
mostrar em um time de verdade (ele correu com o caquético Token naquele ano):
Tom Pryce.
De pontos, o ano foi bem magro. O melhor
resultado foi um terceiro lugar no GP de Mônaco para Jarier, contando-se ainda
um sexto lugar para Pryce no GP da Alemanha daquele ano. Para um time com
estrutura e know-how, a Shadow podia ir muito mais além do que estes resultados
modestos. O DN5 tinha que significar uma real evolução para um time que ainda
carregava os carimbos de bons anos no Can-Am.
Outra vez, Nichols e seu projetista a
tiracolo, Tony Southgate, iriam para uma temporada carregando a chance da
evolução nas mãos. O novo carro era uma clara evolução do DN3, reparando erros
dos projetos passados: correção na aerodinâmica e reequilíbrio do peso do
carro. Esteticamente, poucas mudanças de linhas comparadas ao antecessor, e um
livery que já virava marcante no grid, com seu UOP estampado agora acompanhado
de um degradê em branco, amarelo e vermelho nas laterais.
O DN5 carregava novamente a esperança da
consolidação, e o ano já começou no espanto. Jarier, de cara, já mostrou as
credenciais do novo carro ao cravar a pole na Argentina. No entanto, um problema
na volta de aquecimento arruinou a corrida do francês. No Brasil, Jean-Pierre
repetiu a dose e partiu da pole na corrida que seria vencida por José Carlos
Pace. Outra vez, o pé-de-chumbo foi vítima de um problema mecânico, dessa vez
com o sistema de alimentação do combustível falhando.
Um momento de alento nestes revezes veio
quando a temporada se voltou para a Europa e Tom Pryce, enfim, teve direito ao
segundo DN5 pronto. Venceu a Race of Champions em Silverstone embaixo de chuva
e já mostrava as credenciais do que podia fazer em um F1 para o mundo. Ele
repetiria a dose de velocidade em Silverstone na prova "pra valer" do
calendário, cravando a pole. No entanto, foi um dos envolvidos na carambola da
Stowe na hora do pé-d'agua que caiu no aeroporto naquela que seria a última
vitória de Emerson Fittipaldi na F1.
No geral o ano de 1975 estava até sendo
melhor que o anterior para a Shadow, mas constantes problemas mecânicos
"tolos" minaram o verdadeiro potencial do bólido. De bom mesmo, se é
que dá pra se chamar de "bom", foi apenas o quarto lugar de Jarier no
GP da Espanha, mas que valeria apenas metade dos pontos depois do gravíssimo
acidente de Rolf Stommelen, que paralisou a corrida marcada pela falta de
segurança em cada curva.
Antes que o ano acabasse, mesmo em meio aos
problemas, o DN5 ainda receberia uma atualização que se seguiria até 1976, seu
último ano nas pistas. No entanto, um marcante momento deste bólido foi nos GPs
da Áustria e da Itália, quando o carro de Jarier recebeu motores 12 cilindros
da Matra (abaixo), numa espécie de ensaio da marca francesa para os trabalhos com a
Ligier no ano seguinte.
A ideia exigiu mudanças no DN5, como um
tanque de gasolina e um entre eixos mais comprido para acomodar o engenho. No
geral, o carro - batizado nessa configuração de DN7 (foto abaixo) - ficou até mais bonito com
o novo desenho, mas o desempenho do motor não ajudou muito, com resultados
pífios nas duas corridas. A ideia para 1976 acabou descartada e a Matra se
concentrou por completo na parceria com Guy Ligier para sua equipe na temporada
seguinte.
A Shadow até começou 1976 com o DN5, já na
sua configuração B, e chegou a assustar no GP do Brasil, onde os carros
receberam até os adornos da mundialíssima marca de canetas BIC para a prova
numa forma de compensar o fim da parceria com a UOP para a temporada, o que
comprometeu demais suas finanças.
Esta talvez seria a melhor aparição da
Shadow com o já velho DN5. Jarier chegou a brigar pela ponta, mas acabou
despistando-se da pista. Sobrou para Tom Pryce conseguiu o único pódio do
carro, seu último pódio na F1 e o melhor resultado do time em 1976. Mais tarde,
surgiria o DN8 em suas mãos enquanto Jarier continuaria com o velho DN5B, um
ano complicado e nada mais para o time "sombra".
Uma história atribulada, mas que não tira o
brilho icônico que ficou ao Shadow DN5, um carro que, se não foi vencedor, ao
menos garantiu ao time anglo-americano um lugar especial entre os bólidos
marcantes da década de 1970. Bonito, problemático, mas marcante, simples assim.
''Mônaco do Mediterrâneo''?
ResponderExcluirMas o circuito de Mônaco já é no Mediterrâneo!
O certo seria ''Mônaco Ibérica'' ou ''Mônaco Catalã''.