quinta-feira, 15 de fevereiro de 2018

Mclaren MP 4/7A - Uma rápida análise

Este texto foi motivado por uma discussão que volta e meia surge nos grupões da internet. Talvez pela grande superioridade da Williams FW14B, o pessoal não entende porquê a Mclaren não tenha feito um carro que pudesse competir no mesmo nível. A coisa chegou a um ponto que em Silverstone, Ron Dennis declarou que, ao invés de um cronômetro, levaria um calendário para medir a distância em relação às Williams...


Para os padrões dos anos anteriores, 92 possa ter sido realmente uma lástima. Entretanto, a Mclaren ainda conseguiu 5 vitórias (3 com Senna e 2 com Berger), mesmo que considerando as circunstâncias fortuitas que boa parte delas aconteceu.


Para entender o ano de 1992 da Mclaren, é preciso voltar a 1991. Após ter vencido as 4 primeiras etapas da temporada, a equipe viu a Williams suplantar rapidamente a distância e ter uma performance melhor com uma certa tranquilidade. O FW14 mostrava ser um carro melhor ajustado e com um Renault V10 tão bom quanto o Honda V12.

Diante da ameaça, a pressão aumentou sobre a Mclaren, Honda e Shell para recuperarem o tempo perdido. O escopo de trabalho abrangeu melhorar o carro, motor e combustível, além de desenvolver câmbio semiautomático e suspensão ativa para um possível uso. O trabalho frenético deu certo, pois Senna conseguiu virar o jogo a partir da Hungria e contou com algumas trapalhadas da Williams para vencer o título.

A batalha foi ganha, mas o longo prazo...
 
O escritório de projetos da Mclaren, tocado por Neil Oatley e Henri Durand, no meio da batalha da temporada de 1991 também teve que realizar o desenvolvimento do sucessor do MP4/6, o MP 4/7A. O programa do carro de 1992 previa o uso desde o início do câmbio semiautomático e suspensão ativa, sendo desenvolvidas em conjunto com a Honda, além de vários outros apetrechos como controle de tração e um acelerador sem cabos, chamado de “fly by wire”.
 
Em paralelo, a Honda vinha desenvolvendo uma nova versão do seu V12. A idéia era usar um bloco mais leve e em um ângulo mais aberto do que vinha sendo utilizado (67º para 75º). Em tese, esta mexida permitiria reduzir a altura, permitindo um carro com centro de gravidade mais baixo, e com mais potência. Além de incorporar o sistema variável de alimentação (VTEC, que depois foi usado nos Civic e Accord) introduzido na versão 3 (Spec3).


Visando aproveitar a potencia do novo Honda V12, a Mclaren desenvolveu um novo cambio semiautomatico, transversal, com 7 marchas (uma a mais do que a caixa convencional). O sistema apareceu brevemente nos treinos da Alemanha e Hungria de 91, mas por conta da complexidade e confiabilidade, só foi efetivamente considerado para 92.

 
De acordo com as observações da dupla Oatley e Durand, o caminho era usar linhas mais fluidas e fazer um carro com um efetivo “fundo chato”, coisa que o MP 4/6 tinha um simulacro e que quase todas as equipes usavam até então. Tal artimanha aumentava dramaticamente a pressão aerodinâmica. Para tal, a Mclaren fez um investimento junto com seu parceiro de longa data, a americana Hércules, para introduzir um novo ferramental que permitisse a confecção de peças tipo “fêmea”, mais arredondadas.
 

Mclaren MP4/7A

Outro aspecto que o MP4/7A trazia era o fim da “era Barnard” no tratamento da carroceria. Desde 81, a Mclaren usava uma filosofia de separar a carroceria do chassi, o que dava uma maior flexibilidade para as mudanças aerodinâmicas. Desta vez, a equipe usaria a técnica introduzida em 83 pela ATS de incorporar a carroceria ao chassi, aumentando a rigidez torcional do chassi.
 
Por conta do frenético trabalho ao longo de 91, o foco em 92 veio só no final da temporada. Desta forma, Ron Dennis e o resto da equipe planejou que o MP4/6 faria as 3 primeiras etapas da temporada de 92, deixando a estréia do MP 4/7A para o GP da Espanha, em maio. Parecia uma decisão bem razoável, já que o carro de 91 terminou como o melhor do pelotão.

92 começou e a pré-temporada deixava claro que a Williams era o carro a bater. Os planos da equipe de Didicot era usar um carro provisório, o FW14B, que trazia a versão atualizada da suspensão ativa e lançar o FW15 mais à frente.
 
Enquanto empacotava as coisas para a primeira etapa do ano, após analisar todas as informações, a Mclaren antecipou todo o cronograma de desenvolvimento do MP 4/7A em um mês. Desta forma, uma série de etapas seriam cortadas e o carro seria estreado no GP do Brasil, em abril.
 
Kyalami voltava ao calendário da Fórmula 1 após 7 anos de ausência e havia passado por grandes reformas para receber a “categoria máxima” do esporte. E apesar de todo o esforço, foi um passeio das Williams, especialmente de Mansell. Senna chegou em um distante terceiro, fazendo de um tudo para tentar se manter próximo de Patrese. Todos os alarmes soaram em Woking.
 
Largada do GP da Africa do Sul: Prenuncio do que seria a temporada....

Todo o pacote ficou pronto logo depois de Kyalami e no dia 11 de março, em Silverstone, o MP 4/7A veio à pista pela conduzido por Ayrton Senna. A primeira impressão não foi das melhores nem por parte da crítica e dos pilotos. Senna resolveu não dar muitas declarações e os testes restantes foram feitos pelo piloto de testes, Mark Blundell, que estava anteriormente na Williams e fez boa parte dos testes da suspensão ativa da equipe em 90 (em 91, correu pela Brabham).
 
Os primeiros dados mostravam que o carro tinha problemas de estabilidade, a aerodinâmica não funcionava e o motor Honda RA 122A/B mostrou ter um consumo maior e menos potência do que a unidade de 1991. O quadro não era favorável. Isso fica claro no vídeo feito após estes testes iniciais a seguir (em inglês):





A Mclaren ainda foi para o México com o MP 4/6 e preparava os carros novos a toque de caixa para o Brasil. Após um discreto 4º lugar com Berger e um abandono por parte de Senna, após um acidente nos treinos livres de sexta, era hora de preparar a resposta.
 
Em Interlagos, Ron Dennis mostrou seu poderio: Trouxe 90 pessoas, entre gente da Mclaren e Honda e simplesmente 6 carros à disposição de Senna e Berger: 3 MP4/6 e 3 MP4/7A. Mas quantidade não significou qualidade...os dois pilotos se desdobraram, pulavam alucinadamente de um carro para o outro. Mas para frustração de todos, inclusive do publico, o melhor conseguido foi uma segunda fila no grid, com Senna ficando quase 2 segundos atrás de Mansell.
 
A corrida acabou sendo mais decepcionante ainda: Berger saiu para o grid no MP 4/7A, uma peça cai na Reta Oposta e volta para o box pegar o carro reserva que estava preparado para Senna. Consegue sair a tempo de alinhar no grid e ajustar os pedais. Mas o motor não dispara e tem que largar do box, abandonando 4 voltas depois. Já Senna larga em terceiro e acaba atacando de “caboclo tranca rua”, fazendo atrás de si uma fila de 10 carros, com motor e eletrônica falhando. Após 17 voltas, abandona.
 
Novos testes foram feitos para tentar melhorar o carro, mas os resultados não vinham como o esperado. Para complicar, na Espanha houve a estréia do Benetton/Ford B192, que mostrou seu potencial com um Michael Schumacher que vinha mostrando que não era somente um piloto bancado pela Mercedes.
 
A vitória veio somente em condições fortuitas em Mônaco, quando Mansell, que vinha liderando com tranquilidade, perdeu o controle, bateu e teve que ir ao box parar para troca de pneus. Senna conseguiu passar e segurou o inglês nas últimas três voltas ( o final da prova encontra-se a seguir).




Após isso, Berger ganhou na corrida seguinte no Canadá e deu a esperança de dias melhores. Mas depois a lógica foi reestabelecida e a Williams passeou, dando-se ao luxo de deixar o FW15 parado na fábrica, já que o “provisório” FW14B sobrava na turma.

O resto do ano foi gasto tentando melhorar o carro e se defender dos ataques da Benetton. Entretanto, mesmo com todo trabalho feito pela equipe técnica e a Honda, o MP 4/7A mostrou um crônico problema de instabilidade traseira e a suspensão ativa, que poderia vir a resolver o problema, só apareceu nos treinos livres da Hungria e da Itália. O carro contou ao longo do ano com um sistema de ajuste de altura, com poucos ganhos.

Para completar, o motor Honda continuou com consumo excessivo, o que exigia carregar mais combustível, prejudicando mais ainda o desempenho. No final, a Mclaren conseguiu ainda o vice-campeonato de construtores, com 8 pontos de diferença para Benetton , mas Schumacher terminou na frente de Senna por 3 pontos, conseguindo uma vitória convincente na Bélgica.

A Mclaren acabou por ter um ano bem fraco para seus padrões. E no fim da temporada, a Honda saiu da Fórmula 1. Entretanto, o ano acabou servindo para desenvolver a parte eletrônica, bem como o sistema de suspensão ativa que, numa versão mais simplificada, acabou sendo usado no MP 4/8, de 1993. Mas aí já é outro texto....


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