Meses atrás, este blog contou a
história da Ferrari F92A de 1992 (aqui). Talvez este tenha sido o
ponto de inflexão da equipe para onde ela se encontra hoje. Estes
dias, alguém publicou uma foto da F93A, carro da Scuderia para 93.
Aí surgiu a idéia de continuar a saga ferrarista...
As Origens
Fica mais fácil falar, pois a base
está no texto anterior. Mas vamos lá..
Em 1992, a Ferrari iniciou uma grande
reestruturação. E para comandar a parte técnica, Luca de
Montezemolo e Niki Lauda trouxeram de volta John Barnard. Mais uma
vez, a exigência do inglês era montar uma estrutura técnica na
Inglaterra para escapar da pressão italiana.
Em paralelo, Harvey Postlewhaite, que
estava na casa e não se dava com Barnard, foi deslocado para
atividades de pista. Como dois galos não convivem no mesmo
galinheiro, novos campos começaram a ser vistos e a Tyrrell apareceu
como uma possibilidade....
A Ferrari era uma obra inacabada: tinha
que se preocupar em fazer um carro novo, desenvolver o motor que dava
mostrar de defasagem e desenvolver a parte eletrônica e a suspensão
ativa. Neste ultimo aspecto, os italianos haviam abandonado seus
estudos em 1990 e os retomaram a toque de caixa em 92.
Diante da situação, a proposta de
Barnard era: fazer um carro provisório para o início do ano e
trazer um novo modelo para o meio da temporada. Em paralelo, a área
de motores desenvolvia uma nova versão do V12 para o início do ano,
com uma revisão junto com o novo modelo. Montezemolo aprovou a idéia
e o trabalho começou.
Em pouco mais de 2 meses, George Ryton,
que veio da Tyrrell, fez um trabalho de “convencionalizar” o
F92A: o fundo duplo foi descartado, as laterais foram substituídas
por um perfil mais “normal”. Além disso, o carro contaria com
uma versão melhorada do sistema de suspensão ativa usada no Japão
e Austrália.
Na semana do Natal de 92, o F93A foi
apresentado em Fiorano, confirmando a permanência de Jean Alesi e o
retorno de Gerhard Berger. O que causou estranheza aos fãs foi a
reintrodução de uma faixa branca no carro, no mesmo estilo do
utilizado nos áureos tempos dos anos 70. Montezemolo declarou que a
intenção era trazer bons fluidos, mas depois se soube que foi um
reforço de caixa da Philip Morris (Marlboro).
Uma enevoada Fiorano para um carro enevoado... |
O foco inicial era trabalhar no
desenvolvimento da suspensão ativa e iniciar o trabalho no modelo
novo que estrearia no meio do ano. Berger e Alesi teriam que se
encher de paciência para passar na temporada...
Para Kyalami, Berger foi escolhido para
ser o “boi de piranha” e usar a suspensão ativa. Alesi usou um
modelo híbrido. Nos treinos, o francês conseguiu uma boa 5ª
posição, mas a mais de 2,5 segundos de Alain Prost, o pole
position. Berger ficou em 15º, sofrendo com problemas de software e
fugas hidráulicas. Mesmo assim, quem se deu bem foi o austríaco,
que trouxe na mão e mesmo com o motor quebrado, se classificou em
6º.
No Brasil, a Ferrari chamou a atenção
pelos acidentes de Berger nos treinos e na largada com Andretti.
Alesi fez uma corrida discreta e chegou em 9º. Mas a situação
mudava do lado de fora...
Do lado técnico, Postlewhaite vai
definitivamente para a Tyrrell e Gustav Brunner veio da Minardi,
começando a trabalhar em uma revisão do carro, já que Barnard
estava até o pescoço com o carro novo. Além disso, havia a
incerteza em relação aos novos regulamentos para 1994 e a
continuidade da eletrônica e suspensões ativas.
Do lado de gestão, começava um namoro
com Jean Todt. Então responsável pelo Departamento de Competições
da Peugeot, o francês havia perdido uma queda-de-braço com a
diretoria da montadora em relação ao projeto de uma equipe de F1.
Enquanto isso, a equipe pelejava mas
sobrevivia: Berger conseguia um 6º lugar na Espanha e um 4º lugar
no Canadá. Já Alesi obtinha um improvável 3º lugar em Mônaco.
Pequenas atualizações eram feitas, mas o peso da falta de um
trabalho mais acurado, pagava seu preço.
O início da virada
Entretanto, a virada começava: Após a
vitória da Peugeot em Le Mans, Jean Todt foi anunciado como o novo
Chefe de Equipe. Mas o francês já trabalhava “nas sombras”
desde Mônaco, dando as diretrizes a Sante Ghedini, outro “retornado”
dos anos 70.
Nesta altura, foi decidido que o F93A
seria utilizado até o final do ano e Barnard se concentrar no novo
carro para 1994. Para tentar recuperar o tempo perdido, uma revisão
do carro viria para a segunda parte da temporada.
E ela foi estreada no GP da França,
coincidindo com a estréia de Todt à beira da pista: O carro ganhou
novos bico, aerofólios, fundo e uma atualização da suspensão
ativa. Os pilotos reportaram uma melhora de desempenho, mas sem que
isso se refletisse nos resultados. O máximo que obtiveram foi um 6º
lugar dos treinos com Alesi.
Alesi, Todt e Berger no GP da França. |
Mas a heresia maior estava por vir: foi
fechado um acordo de cooperação técnica com...a Honda! Os
japoneses foram contatados para dar assistência no desenvolvimento
de novas soluções para os motores e eletrônica.
Mais uma vez, os carros vinham
apresentando melhora, mas os italianos vinham sendo acossados pela
Ligier e vendo a Benetton se distanciar cada vez mais. Em Hockenheim,
estreou a nova versão do V12, o 038, que trazia mais cavalaria e a
troca de 5 para 4 válvulas por cilindro. Berger conseguiu mais um
ponto no GP alemão.
Na Hungria, houve a decisão de que as
suspensões ativas continuariam até o fim do ano. Esta decisão
acabou ajudando a Ferrari, já que insistiu com a solução, quando
equipes como a Ligier e a Larrousse abandonaram seus projetos.
Parceria com a Honda começa a dar frutos.
Para a fase mais rápida do campeonato,
a Ferrari trouxe mais um pacote de atualização do carro: novos
aerofólios e mais um difusor revisto. Além disso, a Agip trouxe uma
nova composição de combustível e a Honda pitacou no motor, dando
mais potência. Ao todo, 10kg foram reduzidos do carro.
O resultado da mudança veio na Itália,
onde Alesi conseguiu um terceiro lugar e Berger ficou em sexto nos
treinos. Inclusive, este treino acabou por ter um aparatoso acidente
entre os dois pilotos por uma desatenção do francês...
E na corrida, se aproveitando das
circunstâncias e abandonos, Alesi conseguiu um incrível 2º lugar,
o que serviu como um bálsamo após o terrível ano de 1992.
A maré mostrava que estava boa em
Portugal: Partindo da 5ª posição, Alesi chega na primeira curva
liderando o pelotão! Uma Ferrari não liderava uma corrida desde o
GP da Bélgica de 91! E para a surpresa de todos, o carro 27 se
manteve na liderança por 19 voltas. Mas vieram as trocas e Alesi
caiu, mas conseguiu um ótimo 4º lugar.
A Ferrari também chamou a atenção
por outro motivo neste GP: Na 35ª volta, Berger fez sua troca de
pneus. Ao sair do box, seu carro bate no chão, dá uma guinada para
a esquerda, atravessando a reta dos boxes. Por um problema da
suspensão ativa, quase não houve um acidente de graves
proporções...
Um fim digno
Na fase final da temporada, a Ferrari
leva mais algumas revisões no carro, levando Berger a conseguir uma
5ª posição no grid, a menos de meio segundo da pole position. Mas
na corrida, esta situação não se concretizou, com os dois carros
abandonando. Já na Austrália, pela primeira vez no ano os dois
carros chegaram na zona de pontos: Alesi em 4º e Berger em 5º.
Para um carro provisório e pela
complexidade de tudo que o envolvia, o F93A cumpriu um papel
extremamente digno diante das circunstâncias e após um medonho
1992, embora a posição no campeonato de construtores tenha sido a
mesma (4ª) e a diferença de pontos não tenha sido tão grande (21
para 28). Pode não parecer, mas este “provisório definitivo”
acabou por ser o passo inicial da grande reconstrução da Ferrari,
chegando onde ela está hoje.
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